Em dia nebuloso, com três graus de temperatura máxima, muitas foram as pessoas que, na passada quarta-feira, 27, formaram fila à porta do Espace Vendôme, na praça parisiense com o mesmo nome. Principal objetivo: assistir ao desfile de Felipe Oliveira Baptista inserido no calendário “prêt-à-porter” da Semana de Moda de Paris. O estilista de 37 anos, natural da Ilha Terceira, nos Açores, radicado na capital francesa há mais de uma década, apresentou a nova coleção em nome próprio – trabalho que conjuga, desde setembro de 2010, com a direção criativa da Lacoste.
No interior do Espace Vendôme, os lugares nas oito filas de bancos corridos, todos brancos, foram preenchidos como se de uma sala de teatro se tratasse. Em poucos minutos começou o desfile de 32 coordenados do mais internacional de todos os criadores de moda nacional. Quando as luzes baixaram, “Inquietude” surgiu acompanhada pelo batuque de “As Ayabás”, numa interpretação forte de Maria Bethânia. A inspiração para a coleção veio de Portugal para o mundo. Felipe pegou no modo de estar austero e sóbrio dos portugueses para brincar com a suavidade nas formas, usando as dicotomias austero/sensual, brilho/opaco, feminino/masculino. Olhos de águia ou bocas de lobo ilustravam tecidos sintéticos (seda e nylon; nylon e lurex; organzas de lã) com alguns brilhos e reflexos que pareciam água. A natureza bruta dos Açores ficou visível na variação de tons usados, entre pretos, cinzas e azuis.
Em outubro, Felipe Oliveira Baptista mostrará o seu processo criativo numa exposição no Museu da Moda e do Design (MUDE), em Lisboa. A antevisão da mostra poderá ser vista no Festival International de Mode & de Photographie Hyères, em França, de 26 a 29 de abril, no qual Felipe é presidente do júri.
No mesmo dia, já ao fim da tarde, foi a vez de Luís Buchinho, 43 anos, mostrar o seu mais recente trabalho. A forte componente arquitetónica de La Maison de l’Architecture, a par das paredes descascadas e da sofisticação do seu pé direito, combinou na perfeição com as luzes vermelhas, a batida industrial e agressiva interrompida pelo som dos megafones com palavras de ordem. “Identidade” tem Portugal nos anos 70 e a Revolução de abril de 1974 como agente de memória criativo. “Procurei algo dentro do País que retratasse a abertura de mentalidades”, explica o estilista nascido em Setúbal, a morar no Porto desde os 16 anos. O interesse em fazer coleções a partir do seu imaginário como cidadão resulta da lembrança guardada dos cartazes políticos da época, com um grafismo simples, das metralhadoras e dos cravos.
Na passarela, um guarda-roupa urbano com silhuetas fortes e afirmativas, com uma influência retirada ao vestuário masculino. Construções geométricas de livres diagonais, detalhes assimétricos e grafismos arrojados. O vermelho, preto e branco foram as cores usadas nas peças estruturadas, de ombros marcados, de corte reto, num espírito retro/moderno para o qual Luís Buchinho usou materiais como pele, lãs feltradas, crepes e tweeds de lã.
Na próxima terça-feira, 5, será a vez de Fátima Lopes abrir o penúltimo dia da Semana de Moda de Paris, no qual desfilarão também Chanel, Valentino, Alexander McQueen ou Hermès, entre outros. Às nove e meia, na La Maison de la Chimie.