“Tu gostas de fazer bolas de sabão?”, quis saber João Oliveira sobre Gaspar.
Mas Gaspar estava demasiado ocupado para falar com o deputado comunista. Já tinha terminado a sua obra de arte, na banca das pinturas, e enchido o copo de pipocas. Agora, precisava de soprar todo o conteúdo do frasco de sabão, que traz nas mãos.
“Olha aqui o camarada”, pedia-lhe a avó. E Gaspar lá aceitou dividir a sua atenção entre João Oliveira e as bolas de sabão. Foi assim – a falar para quem só daqui a uns bons anos vai votar e para quem já estava convencido com a mensagem da CDU – que a figura principal da campanha comunista (depois do afastamento de Jerónimo de Sousa e de João Ferreira, por motivos de saúde) passou a manhã deste domingo. Vindo de Évora, onde foi votar antecipadamente, o líder do grupo parlamentar do PCP chegou a Vila Franca de Xira, distrito de Lisboa, já a feira dedicada às crianças estava montada. Seis bancas com comida, jogos, pinturas e balões preenchiam o espaço central do Jardim Municipal Constantino Palha e criavam o cenário para a ação de campanha dedicada às políticas afetas aos mais novos.
A radiografia, feita por João Oliveira, é uma espécie de pescadinha de rabo na boca. Segundo o deputado alentejano, as crianças devem ter mais tempo e espaço para brincarem e conviverem, nomeadamente, com os pais. Para isso, os pais precisam de ter empregos com horários mais estáveis e com salários dignos, que evitem, horas extras e serviço noturno.
Assegurar as condições laborais e dar mais tempo aos pais para cuidarem dos seus filhos é, para o cabeça de lista da CDU por Évora, das melhores políticas demográficas que se podem implementar, a juntar ao desagravamento dos custos ligados à saúde e à educação dos mais novos. E sobre isto, João Oliveira reclama os dividendos do trabalho dos comunistas na aprovação de medidas como a dos manuais gratuitos na primária, do passe até aos 12 anos ou das creches sem mensalidade, para as crianças que começarem este ciclo em setembro de 2022.
“Nos últimos seis anos, conseguimos transformar em realidade aquilo que parecia impossível. Andávamos há 20 anos a discutir estas propostas e ouvíamos respostas que se aproximavam à ideia de que isso eram unicórnios, que não era possível. Não deixámos de lutar pelos unicórnios e a verdade é que os transformámos em realidade”, disse, servindo-se do momento musical anterior, em que a cantora e professora Vanessa Borges interpretou uma musica sobre unicórnios.
O caminho será a criação de mais creches para garantir o acesso universal e gratuito a todas as crianças e “resolver os problemas dos pais”, indicou João Oliveira, notando ainda que “a pobreza infantil é a pobreza dos pais, das famílias”: “temos de ir às raízes do problema”. Assim, “aumentar o Salário Mínimo Nacional é uma emergência”, tal como combater os contratos precários e os horários instáveis, reduzindo estes últimos para as 35 horas semanais. “A vida tem de ser mais do que isto. Mais do que esta rotina” e “quem quer ter filhos não pode ser tratado como se tivesse um capricho”, desejou João Oliveira, perante um plateia com cerca de uma centena de pessoas, entre pais, avós e filhos.
Na fila da frente, sentados em cadeiras com o devido distanciamento social, encontravam-se os vereadores comunistas da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira e candidatos às legislativas pelo círculo eleitoral de Lisboa, Joana Bonita e Nuno Libório; os também candidatos por Lisboa Margarida Botelho, Ricardo Costa e a deputada do PEV Mariana Silva, que vieram dar o seu apoio ao único partido cuja caravana da campanha passou pela cidade ribatejana. Desde 2011, que a coligação que junta o PCP aos Verdes está a perder votos, nas legislativas, em Vila Franca de Xira, mesmo assim, mantém-se como a terceira força política, atrás do PS e do PSD. Na cidade, o esforço dos comunistas para não reduzir o número de votos é notório: começaram a meter folhetos programáticos nas caixas do correio e a distribuí-los na rua muito antes dos outros partidos.
O trabalho e a família na balança
Pelo palco improvisado, junto ao coreto do jardim, passaram ainda Rosário Silva e Marta Calisto, para deixarem o seu testemunho sobre a conciliação do trabalho com a vida pessoal. “Temos de atropelar a vida pessoal para conseguir manter o nosso trabalho”, considerou a primeira, que trabalha com crianças numa IPSS local, e para quem “os direitos à parentalidade não passam do papel”.
“Quando fui mãe senti na pele que nunca temos tempo para os nossos filhos”, continuou Marta Calisto, que tem um filho de sete anos e admite não pensar ter outro por causa da falta de tempo que teria para lhe dedicar. “A maioria de nós trabalha nove horas, passa cerca de duas horas a caminho de e para casa e quando chegamos há as refeições e os banhos. As educadoras passam mais tempo com eles do que as mães”.