Catarina Martins mostrou-se este domingo confiante de que o Bloco de Esquerda (BE) vai conseguir ter força suficiente para integrar o Governo, mas sinalizou que o partido que chefia não o fará a qualquer custo. A coordenadora nacional dos bloquistas encerrou a XI Convenção, que decorreu em Lisboa, a afirmar que “tudo está em aberto” e que só os votos determinarão se a vontade de ser poder vai ou não ter tradução prática.
“Não nos perguntem, por isso, se queremos fazer parte do próximo Governo que ainda não foi eleito, porque temos a certeza de que alcançaremos a força para ser parte de um Governo quando o povo quiser”, atirou Catarina Martins, nos instantes finais da intervenção que durou cerca de 28 minutos.
Na opinião da líder bloquista, a questão que deve ser suscitada é “se é possível [haver] um Governo que cumpra a saúde, a escola, as pensões e o emprego”, ou seja, um Executivo em que o equilíbrio de forças – apesar de não ter especificado o arranjo que pretende – puxe o PS para a esquerda.
Para o Bloco, “o grande projeto da esquerda no século XXI” terá de passar por devolver a economia à esfera democrática, motivo pelo qual, acrescentou, será também necessário dar mais força aos bloquistas. “Teremos mais força e cumpriremos”, assegurou.
No entanto, as prioridades mais concretas para o futuro mais imediato (para esta e para a próxima legislatura) foram apresentadas do púlpito do pavilhão desportivo do Casal Vistoso.
A primeira é a aprovação da nova lei de bases da saúde (que o Governo mantém numa gaveta); a segunda assenta na demografia (para que um filho não seja visto como “fator de empobrecimento”), a terceira passa pelo combate às alterações climáticas – evitando perfurações para prospeção de petróleo, investindo nos transportes públicos e reduzindo progressivamente passes sociais -; a quarta radica na necessidade de nacionalização da banca e da energia – notou que em 40 anos de privatizações na energia e na banca levaram a “que os portugueses paguem a eletricidade mais cara, enquanto pagaram à banca 40 mil milhões de resgates e garantias” -; e a quinta relativa a um “salto de qualidade da democracia”, o que a levou a recordar a proposta do BE para criar um entidade que fiscalize a transparência no exercício de cargos políticos.
Com a secretária de Estado Mariana Vieira da Silva, em representação de António Costa, e com Ana Catarina Mendes, a liderar a comitiva do PS, na plateia, Catarina Martins recordou os momentos de tensão na chamada “geringonça”. Recordou as negociações “prejudicadas por interesses económicos ilegítimos”, como quando o PS recuou na ideia da taxa que incidiria sobre a produção de energias renováveis, mas assinalou que “só num momento a legislatura esteve em risco” – aquele que o Governo tentou compensar os patrões pelo aumento do salário mínimo através da redução da Taxa Social Única (TSU) paga pelas empresas.
Apropriando-se parcialmente do mote de António Costa, Catarina Martins observou que “para o Bloco, palavra dada é palavra cumprida” e garantiu aos professores que tudo fará para que todo o tempo das suas carreiras seja contabilizado para efeitos de progressão. “Não os abandonamos!”, enfatizou.
Entre os vários remoques à direita – que acusou de nostalgia e à qual apontou o dedo, com ironia, por só ela poder dizer “com que políticas se cose” quando critica a esquerda por servir “clientelas” (funcionários públicos, pensionistas, trabalhadores com salário mínimo, etc.) no Orçamento do Estado -, lá voltou a disparar sobre o PS (o alvo preferencial dos mais destacados quadros bloquistas durante este fim-de-semana), lamentando que António Costa tenha terminado o congresso socialista “sem referir que o seu Governo só vive” porque assenta numa maioria sustentada pelos parceiros à sua esquerda. “Eu prefiro a cordialidade. Saúdo com amizade todas as forças que participam nesta convergência”, declarou, bastante aplaudida pelos congressistas.
Nesta XI Convenção, Catarina Martins e os principais dirigentes do partido deixaram bem claro que já estão a apontar às europeias (em que a cabeça de lista do partido voltará a ser Marisa Matias) e às legislativas, ficando patente que, além de reforçar a expressão do BE nas urnas, querem impedir os socialistas de chegar à maioria absoluta. “Agora, a esquerda”, defenderam os bloquistas quase em uníssono. Será mesmo?