Miguel Albuquerque, ex-presidente da Câmara Municipal do Funchal, venceu as eleições internas no PSD/Madeira (PSD/M) com uma margem folgada (64%) tendo por adversário na 2.ª volta Manuel António Correia, o homem escolhido por Alberto João Jardim. O novo líder prepara o congresso deste fim de semana (dias 10 e 11), que conta com a presença de Pedro Passos Coelho. Albuquerque garante que fará “uma mudança de políticas, de protagonistas, de posturas e de procedimentos”, mas sem purgas internas.
Como irá lidar com as sensibilidades internas saídas desta disputa de seis ?candidatos à sucessão de Alberto João Jardim? Quando é que inicia a purga?
Não haverá purga nenhuma. Antes pelo contrário. Quero que o PSD/M seja um partido aberto, plural, onde cada um possa exprimir as suas opiniões.
Mesmo que sejam críticas diretas ao líder?
Com certeza. É essencial que se crie um ambiente de naturalidade, de democracia e de liberdade, sem medo de qualquer tipo de perseguição ou revanchismo. Vamos tentar manter o partido mobilizado, unido nas suas diferenças. Só um líder fraco tem medo do pluralismo interno.
A sua candidatura foi colada aos “interesses empresariais” de Jaime Ramos, o secretário-geral de sempre, o companheiro de estrada de Jardim, o homem da máquina partidária. Levantou-se a suspeita, inclusive, que a candidatura de Jaime Ramos era faz-de-conta. Algum fundamento?
Foi uma estratégia, uma tática eleitoral, por parte dos meus adversários e que não resultou. Sendo Jaime Ramos um homem da extrema confiança do dr. Alberto João Jardim, é óbvio que não podia estar afeto à minha candidatura. E é bom ter memória. Os que me acusaram dessa mentira, esses sim, estiveram ao lado de Jaime Ramos, em 2012, contra a minha candidatura à liderança do PSD/M no desafio com o dr. Jardim.
Jaime Ramos e outros jardinistas vão continuar por aí. A solução é votá-los ao ostracismo, fazer de conta que já não existem?
Claro que não. O PSD/M tem o seu património, a sua história, e não vamos fazer como nos regimes totalitários em que se apagavam as fotografias dos antigos dirigentes.
A derrota das últimas eleições autárquicas (PSD/M perdeu 7 dos 11 concelhos) acelerou o fim do jardinismo?
Nos últimos anos persistiu-se no erro. Esgotara-se a fórmula. Pena que não tivesse havido esta alteração em 2012 e poder-se-ia travar a perda expressiva de votos e de autarquias.
Há anos, numa entrevista, Jardim disse que quando abandonasse a liderança do governo e do partido ia “virar hippie”. Acha que está na altura de concretizar esse desejo?
[Risos] Não sei…. o dr. Jardim faz o que quiser da vida.
Como irá materializar a mudança no PSD/M?
De certa forma, essa mudança está a materializar-se. E não por minha causa. Eu só interpretei o sentimento dos cidadãos e dos militantes. Esta votação (64%) não aconteceu por acaso. Fizemos uma candidatura contra o status quo, contra poderes muito fortes como o aparelho do partido, da própria administração pública e contra os interesses do governo regional que pretendia prolongar o seu mandato até ao fim, outubro deste ano. Mas a força individual das pessoas e do voto livre de cada uma delas foram mais fortes do que tudo o resto.
Podemos falar em rutura?
Vai haver uma mudança de políticas, de protagonistas, de posturas, de procedimentos…
Incluindo a relação com os outros partidos, hostilizados durante 40 anos e apelidados de “tontos”?
É óbvio que haverá diálogo. Acredito que vamos ganhar as eleições antecipadas. O meu relacionamento será normal e de respeito, o que não significa consensual, com toda a oposição. Mas admito que possa haver consensos nalgumas áreas que ultrapasse o universo de uma legislatura, como é o caso do novo hospital.
O PSD/M de Alberto João Jardim é visto como o partido que limitou a margem de atuação do setor privado. Alguns empresários acusam o governo de intervenção despropositada e de não criar condições para o tecido económico da ?Madeira se desenvolver. Quais as perspetivas para esta área sensível em termos de futuro?
Eu trabalhei muito com empresas… e nunca trabalhei para o governo regional. As empresas têm, de facto, capacidade de resistência notável, apesar da vida dificultada, quer em termos de carga fiscal quer de burocracias de procedimentos, o que acarreta desvantagens competitivas. Temos de criar condições para as empresas funcionarem em áreas decisivas para a economia regional, turismo, centro internacional de negócios, construção, entre outras. Podemos ajudá-las de diversa maneira, nomeadamente trabalhar com o AICEP ou criar uma agência de internacionalização no Funchal que permita a conquista de novos mercados.
Falemos das relações com a República. Alguma vez a Madeira terá condições para pagar a dívida? Mais cedo ou mais tarde, o Estado será ou não obrigado a assumir parte da dívida, tal como fez António Guterres em 1998?
Nós estamos a cumprir as nossas obrigações, a exemplo do Estado português. Mas precisamos de condições em que esse pagamento possa ser feito sem colocar em causa o funcionamento dos serviços essenciais, saúde e educação, assegurado pelas receitas regionais, nem os serviços da administração regional e que consiga libertar verbas para a economia. Temos, realmente, um problema graças ao PAEF (Plano de Assistência Económica e Financeira); uma carga fiscal na Madeira mais elevada que nos Açores e no Continente, o que é devastador.
Essa negociação pode ser já iniciada com Passos Coelho, mas depois há eleições. Claro que o PSD Madeira sempre se deu bem com os governos socialistas…
O PAEF termina dentro de pouco tempo, já este ano. A questão é saber em que medida nos são garantidas condições para atrairmos maior receita fiscal e captação de investimento estrangeiro. Temos uma ferramenta, o CINM (Centro Internacional de Negócios da Madeira). Apesar de todas as dificuldades, o CINM gerou 163 milhões de euros de receita. A nível nacional – partidos, empresas e opinião pública -, ainda ninguém percebeu a importância que este centro pode ter ao nível da internacionalização da economia portuguesa. O CINM não pode ser encarado como uma excentricidade da Madeira mas como um fator fundamental para o desenvolvimento do País.
Acabou-se o discurso do contencioso das autonomias? Haverá paz institucional?
É urgente restabelecer pontes de diálogo permanente com as instituições do Estado, com o Governo da República e com os media nacionais. A Madeira é uma região fantástica e temos de retomar a nossa notoriedade. Uma região bem infraestruturada com um clima atrativo para o investimento nacional e internacional, com pessoas qualificadas e condições para sermos uma das regiões mais atrativas da Europa.
Tem uma relação privilegiada com Pedro Passos Coelho, mas António Costa pode vir a ser o novo primeiro-ministro. Algum problema?
A Madeira deve manter uma relação adulta e permanente com o Governo da República, com os partidos. O contencioso das autonomias teve uma época. Hoje não tem sentido esse discurso. Manter um diálogo permanente com a República, o que não significa fraqueza mas inteligência, na salvaguarda dos interesses regionais e do próprio Estado.
Durante a campanha, prometeu resolver o problema do Jornal da Madeira, órgão de comunicação detido em 99% pelo governo regional, estando o restante (1%) na posse da Diocese do Funchal. Como?
Tem de ser privatizado. É importante existir dois jornais diários na região. Mas tem de haver uma solução empresarial. O governo regional já injetou 43 ou 44 milhões de euros no JM e esta situação não pode continuar. Não sei se a Diocese quer ou não ficar com o jornal. Assim é que não pode ficar. Mas temos de assegurar os postos de trabalho dos jornalistas.
Vai imitar Alberto João Jardim, discutir os programas de governo nos adros das igrejas?
Não, não. Isto não é um programa de freguesias. É um programa regional, com linhas de orientação claras em que todos serão envolvidos e ouvidos, nomeadamente no que toca a políticas setoriais, saúde, educação, turismo e transportes, centro internacional de negócios, etc.
A política de alianças será considerada logo de início ou irá remetê-la para o dia seguinte às eleições regionais?
É demasiado cedo para falar disso. Neste momento, vamos preparar um bom programa, reconquistar a confiança dos madeirenses e estabelecer metas. O nosso grande objetivo é obter uma maioria absoluta.
O PSD acaba de votar favoravelmente a proposta de alteração às subvenções aos partidos atribuídas pelo parlamento regional. O orçamento para 2015 atribuía-lhes 5,57 milhões de euros, cabendo ao PSD mais de metade do total…
Eu já defendia a redução dessa verba. E disse-o publicamente. Os partidos políticos têm de se adaptar à mesma realidade social e económica que, diariamente, vivem os cidadãos.
O PSD/M possui uma máquina enorme, 54 sedes, uma por freguesia, imensos funcionários e um passivo acumulado estimado em 13 milhões de euros. Como vai reduzir os custos?
Não posso pronunciar-se sobre números porque não tenho ainda as contas do PSD/M. Preciso saber qual é a sua situação real. Não faço parte dos órgãos dirigentes há muitos anos. Nem sei qual é a dívida. Mas o que se gasta em campanhas eleitorais é um absurdo.
Tendo em conta a carta que Alberto João Jardim lhe enviou na noite das eleições, teme que este possa interferir negativamente na liderança do PSD/M? Que peso deu a essa carta?
Penso que não terá uma intervenção negativa. Quanto aos vaticínios, ficou provado que deram para o torto. Os receios que demonstrou não têm fundamento. A estratégia do inimigo externo está morta.