Encenada por Marco Medeiros, a peça “O Diário de Anne Frank”, de Frances Goodrich e Albert Hackett, tem Beatriz Frazão no papel da alemã de origem judaica que viveu escondida dos nazis durante dois anos, relatando o seu desafiante quotidiano.
Anne Frank tornou-se uma figura reconhecida depois da divulgação do seu diário, pelo pai, único sobrevivente da família perseguida pelos nazis, que, entre 1941 e 1945, mataram mais de seis milhões de judeus.
“É uma tragédia, mas recheada de muita esperança, que nos é dada por uma criança que se torna adolescente durante o espetáculo”, salientou o encenador, Marco Medeiros, em declarações à agência Lusa.
O seu maior objetivo, na reconstrução desta história em palco, foi “o sentido de alerta, e, por isso, o que regrou, foi uma enorme responsabilidade pelo tema”.
No diário, a jovem descreve o período em que sobreviveu à perseguição nazi – que aniquilou judeus, ciganos, deficientes, homossexuais e opositores políticos – deixando um testemunho de resiliência e esperança que continua a inspirar gerações até à atualidade.
“Este diário é, talvez, das obras literárias mais vendidas do século passado e também deste século, e não há quem não conheça a história. Toda a gente que quer ver o espetáculo já sabe ao que vem”, disse, sobre o desfecho trágico da protagonista, que viria a ser descoberta e levada para o campo de concentração de Bergen-Belsen, onde morreria, em 1945, no final da 2.ª Guerra Mundial.
Marco Medeiros disse à Lusa que realizou uma profunda pesquisa histórica sobre o tema, recorrendo a testemunhos de vítimas do Holocausto: “Vários diziam que tinham medo que este acontecimento se tornasse numa peça de museu, ou num filme muito bonito e fantasiado”, referiu, acrescentando que a morte de milhões de pessoas que atravessaram este calvário dos campos de concentração “não tem nada de bonito”.
Na construção da peça, o encenador tentou “passar a maior crueza, sem artifícios”, e quando os usa, “são propositados, para contrastar, porque muitas vezes apoia-se a esperança em romancear, em pôr rodriguinhos, artifícios”, em algo que deve servir de alerta “com a maior crueza”.
No entanto, Marco Medeiros encontra beleza nesta história: “É a esperança de um grupo de pessoas que durante dois anos esteve enclausurado, para fugir à ignorância humana”.
“Passados 70 anos desde o Holocausto, o mais interessante é que a essência humana não se alterou: a inocência é transparente neste espetáculo, e temos a perceção que a inteligência desta criança era inacreditável”, concluiu o criador.
Escrito entre 12 de junho de 1942 e 01 de agosto de 1944, o “Diário de Anne Frank” foi publicado pela primeira vez em 1947, revelando ao mundo o quotidiano de dois longos anos de uma adolescente forçada a esconder-se, durante a ocupação nazi em Amesterdão.
“A esperança é o que alimenta os nossos jovens e crianças para combater a ignorância humana, que mantivemos”, reiterou o encenador, que junta em palco Anabela Moreira, Carla Chambel, Catarina Couto Sousa, Diogo Mesquita, João Bettencourt, João Reis, Paulo Pinto, Rita Tristão da Silva e Romeu Vala.
Apesar de ser uma história com mais de meio século, continua atual, na opinião do encenador: “Mais do que nunca, faz hoje sentido. Com o passar das gerações, felizmente temos acesso a muita informação, e deixaram de ser tabu, mas há temas que estão fechados, e não são debatidos, acontecem à frente dos nossos olhos. Ainda por cima, votamos neles e permitimos que aconteçam. Isso é que é muito assustador”.
Do medo dessa altura, Marco Medeiros faz a ponte com o medo atual da guerra que decorre na Ucrânia, invadida pela Rússia: “É preciso coragem para enfrentar estes tempos”, sustenta.
“Ainda há temas como o das raças que incentivam batalhas, em pleno século XXI. Será que não evoluímos?”, questiona o encenador.
“O Diário de Anne Frank” estreia-se na quinta-feira, às 21:00, resultado de uma produção do Teatro da Trindade INATEL e estará em cena até 13 de novembro, de quarta-feira a sábado às 21:00m e aos domingos às 16:30.
Na quarta-feira decorrerá um ensaio solidário, cuja receita reverterá na integra para a associação Padrinhos do Mundo.
AG // TDI