Muitos israelitas adoram citar uma frase atribuída a Ben-Gurion, o homem que proclamou o Estado hebraico em 1948 e foi primeiro-ministro até 1963: “Um judeu que não acredite em milagres não é realista.” A 26 de abril de 2021, numa carta aberta publicada no diário Jerusalem Post, três ilustres generais na reserva alertaram para a iminência de israelitas e palestinianos estarem, outra vez, em “rota de colisão” e a necessidade de os EUA intervirem para que o Médio Oriente não assistisse “a mais um conflito bélico”. Nitzan Alon, Avi Mizrahi e Gadi Shamni, antigos responsáveis pelo comando central das Tsahal (as Forças Armadas), diagnosticavam alguns dos desafios imediatos do país, que é um dos mais desenvolvidos do mundo e que tem mais empresas de alta tecnologia cotadas no Nasdaq de Nova Iorque do que todos os Estados-membros da União Europeia: “Os tumultos em Jerusalém; a política do Hamas; a situação humanitária em Gaza (…); a anexação de facto da Cisjordânia – antes arrepiante e agora galopante –; a erosão da popularidade e da capacidade governativa da Autoridade Palestiniana; a violência dos colonos israelitas contra os palestinianos; as tensões à volta dos lugares santos e muito mais.” A realidade veio provar até que ponto tinham razão.
A velha província otomana a que nos habituámos a chamar Terra Santa, e que vai do Mediterrâneo ao Vale do Jordão, está a ser palco de uma nova vaga bélica que, desde 10 de maio – início oficial das hostilidades –, já causou perto de duas centenas e meia de mortos, dez mil desalojados e ameaça provocar a enésima crise humanitária da região. Os civis inocentes são quem paga o preço mais elevado pela nova refrega, caso de uma família do campo de refugiados de Al-Shati, na parte norte da Faixa de Gaza, que perdeu oito crianças na sequência de um bombardeamento da Força Aérea israelita. Ou do médico Ayman Abu al-Ouf, autoridade máxima local na resposta à Covid-19. Como sempre sucede neste tipo de circunstâncias, crimes de guerra podem estar a ser cometidos diariamente pelo Estado hebraico e pelo Hamas, o movimento islâmico que os EUA e a União Europeia consideram terrorista e que controla Gaza desde 2007. Organizações de Direitos Humanos como a Amnistia Internacional, a Human Rights Watch e a Peace Now já solicitaram ao Tribunal Penal Internacional (TPI) que investigue o que está a acontecer no terreno, e a procuradora-chefe deste órgão com sede em Haia, na Holanda, já admitiu publicamente que está a fazê-lo.