A crise constitucional em Espanha ultrapassou uma “linha vermelha”, avisou Carles Puigdemont, no momento em que a polícia espanhola irrompeu pelos edifícios do governo catalão (Generalitat) e deteve a equipa que organiza o referendo sobre a independência. Madrid “suspendeu de facto o autogoverno”, acrescentou o presidente da Generalitat, que acredita estar em curso uma “agressão coordenada” contra a região.
As ruas de Barcelona estão a encher-se rapidamente de pessoas em protesto contra a grande operação policial lançada com o objetivo de travar o referendo secessionista de 1 de outubro. Ao som de “Fora forças de ocupação” e “Liberdade”, e alguns cravos vermelhos na mão, milhares de pessoas reúnem-se em frente à sede do partido pró-independência CUP e de edifícios oficiais onde decorrem os raides da Guardia Civil. Um deles é o Departamento de Finanças da região, onde se investigam ao cêntimo se houve transferências para a realização do referendo. Madrid, como explica esta tarde o ministro das Finanças Cristóbal Montoro no congresso espanhol, tomou o controlo das contas da Generalitat.
Até ao momento foram detidas 14 pessoas e cerca de dez milhões de boletins de voto foram apreendidos numa fábrica em Bigues i Riells. “Estamos a caminhar para uma situação em que haverá presos políticos em Espanha”, reagiu Pablo Iglesias, líder do partido de esquerda Podemos em Madrid. Iglesias é, por enquanto, o único dos principais líderes políticos espanhóis a aceitar que a Catalunha convoque um referendo e decida o seu futuro.
O referendo foi suspenso pelo Tribunal Constitucional espanhol há duas semanas, uma decisão que a Generalitat continua a desafiar abertamente. “A 1 de outubro saíremos de casa, levaremos um boletim de voto e iremos usá-lo”, garantiu Puigdemont.
O choque entre Madrid e Barcelona está a um ponto de não-retorno. As palavras de Puigdemont, na declaração improvisada a meio do dia, insinuam que o governo de Mariano Rajoy já acionou oficiosamente o artigo 155º da Constituição, que permite ao Estado central retirar competências a uma comunidade autónoma. Nunca em 39 anos de Constituição espanhola este mecanismo, chamado de ‘coerção estatal’, foi usado. Há dois meses os socialistas do PSOE rejeitavam aceitar esta medida drásticas, mas nos últimos dias retiraram esse veto.