Elegante, errante, solitário, filosófico, soldado da fortuna sem pátria nem fortuna propriamente dita, enigmático, de perfil virado para a lua veneziana, fumador inveterado, encantador de gatos ou dançando um tango fatal, rodeado de personagens femininas carismáticas ou sonhando acordado, Corto Maltese insuflou a utopia da viagem e da aventura em muitos leitores, desde a sua primeira aparição nesse álbum icónico que é A Balada do Mar Salgado. A primeira frase do álbum de 1967 era um programa para o próprio personagem: “Sou o Oceano Pacífico e sou o Maior. É assim que me chamam há já muito tempo, embora não seja verdade que eu seja sempre pacífico.”
Mas, passados cinquenta anos desse momento seminal na banda desenhada europeia, Corto Maltese surge agora a uma nova luz em Equatória. Assim se chama este segundo álbum assinado pela dupla Canales e Pellejero, continuadores do universo original do criador Hugo Pratt, que vai ser lançado pela editora francesa Casterman no dia 27 de setembro – e que conhecerá uma edição portuguesa logo em Outubro pela mão da Arte de Autor, editora nacional que tem vindo a republicar a obra dedicada ao personagem.
Novo look
Em Equatória, Corto passeia por novas geografias e assume pose… de pistoleiro. O argumentista Juan Díaz Canales imaginou-o na África equatorial de 1911, tendo o conflito colonial como pano de fundo mas sem esquecer Veneza: entre as duas geografias, o anti-herói procura o espelho do padre Jean, um objeto misterioso que remonta ao tempo das cruzadas. Nesta demanda, Corto encontra três mulheres: a jornalista Aida, Ferida, a exploradora que anda em busca do pai perdido, e ainda a antiga escrava Afra.
Mas é o desenhador Rubén Pellejero que nos revela o marinheiro melancólico armado com um revólver à cintura – coisa inédita. Em mangas de camisa e lenço vermelho ao pescoço, sem a famosa casaca azul à vista, mãos nos quadris em atitude desafiadora, com presas de elefante aos pés, e olhando diretamente para o leitor, este Corto Maltese dá-se ares de cowboy, brigão, combativo – assim também achou o Le Fígaro, que pré-publicou esta nova aventura durante o verão. Em fundo, a capa de Equatória exibe as cores saturadas e intensas de uma selva exuberante, a quilómetros da paleta contrastada de pretos e tons suaves dos mares e ruínas habituais.
Esta é a segunda história assumida pela dupla de criadores espanhóis: em 2015, lançaram Bajo el sol de medianoche, na versão portuguesa Sob o Sol da Meia Noite. Mas Equatória promete ser um ponto de viragem para a mitologia e iconografia de Corto Maltese, marinheiro de tantas viagens.