EDUQUEM ESSES RAPAZES…
Nesta última ida à Terceira, almocei com um casal cuja idade rondava os setenta anos. Eram meus parentes muito próximos. A senhora, mulher de grande cultura e delicadeza de sentimentos, fez-me a seguinte pergunta: “- Qual será a razão porque alguns adolescentes tratam menos bem os que vão envelhecendo?”.
Esta pergunta deixou-me pensativa. Tentei compreender o que motivava tais reacções nas gerações mais jovens.
Não tendo formação específica nas áreas de psicologia e sociologia, só posso falar do que fui vendo acontecer no meu tempo de professora no activo, bem como de estudos e leituras que fiz durante o meu percurso de vida.
Em primeiro lugar, sei que só muito tarde (referindo-me à idade cronológica) as pessoas sentem que estão caminhando numa estrada cujo fim é o mesmo para todos – a velhice e a morte. Só não chegam à terceira e à quarta idade os que ficam pelo caminho, ou seja, os que morrem fora do normal tempo de vida.
Por outro lado, consciente ou inconscientemente, temos todos medo de ver “no espelho” o que sabemos que vamos ser. E isso causa-nos tal apreensão que fazemos tudo para que a imagem que o espelho nos mostra desapareça.
Haverá, certamente, muitos outros motivos para os “maus-tratos” psicológicos ou físicos aos mais velhos, mas penso que os dois que citei representam, de certa forma, o essencial para a compreensão da matéria que estou a trabalhar.
O homem nasce para cumprir o talento que transporta no seu íntimo. Mas vem ao mundo completamente inútil. Depende dos outros para tudo. Na mesma medida do seu crescimento físico vai fazendo construções no cérebro que irão ditar muitas das suas condutas perante o mundo e a sociedade. Mas, para que a sua construção seja de boa qualidade necessita de educadores com mérito nas áreas da maternidade e paternidade, na escola, na vizinhança…
Convém referir, ainda, os valores morais e éticos que o espaço que ocupa no mundo – cidade, Região, País – lhe transmitem continuamente, através dos agentes da governação.
Como todos sabemos, a modificação dos costumes, com a liberalização excessiva e permissiva de actos pouco reflectidos transformados em leis, tem gerado o caos no pequeno mundo que é o cérebro do homem. E vemo-lo – o único animal racional existente na Terra – perdido no meio das ideias que lhe são transmitidas e/ou impostas por conveniências que ele próprio desconhece.
Encontramo-nos, assim, com infâncias perdidas, adolescências sem rumo, juventudes sem valores de qualidade que os ajudem a tomar as melhores decisões para si e para a sociedade em que vivem e convivem.
Neste novo paradigma de sociedade não há lugar para o respeito devido ao idoso, ao excluído, ao que está mais vulnerável. Todos tentam salvar-se a si próprios, desrespeitando regras em cima de regras, empurrando para a berma da estrada quem incomoda ou parece incomodar, fechando os olhos ao óbvio movimento do corpo que a partir do dia em que nasceu começou a morrer.
Curiosamente, há um livro de Eric-Emmanuel Schmitt cujo título é “Óscar e a senhora cor-de-rosa” que representa, de forma brilhante, o que se passa com a maioria das pessoas perante o fim de vida. O assunto principal deste livro é a doença em fase terminal, que penso poder comparar à velhice vista pelos olhos dos mais novos.
O Óscar é um doente oncológico, de dez anos, sem possibilidade de cura e em fase terminal de vida. Todos o sabem, desde o médico que lhe fez o transplante de medula óssea até às enfermeiras e restante pessoal existentes no Hospital em que o Óscar se encontra. Até os pais parecem fugir a qualquer pergunta que o menino faz sobre o seu estado de saúde.
“O hospital é um lugar super-fixe…se fores um doente agradável.” “O meu médico já não tem ânimo quando me examina, de manhã. Sou uma decepção.” “Se dizes morrer num hospital, ficam todos surdos.”. Frases como estas são pronunciadas pelo menino. Ele sente e sabe que todos fogem da palavra “morte”.
O envelhecimento, penso, também assusta os mais novos e, quiçá, todos nós. Daí podem derivar comportamentos de rejeição ou intimidação sobre pessoas que, simplesmente, estão à nossa frente na estrada da vida terrena.
Dra. Maria da Conceição Brasil mcbrasil2005@hotmail.com